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Bebês Reborn e a Infantilização Tóxica na Sociedade Contemporânea

Por Carlos Lima*

Como não sou psicólogo, pedi a ajuda a IA para fazer esse texto sobre a proliferação dos chamados “bebês reborn” — bonecos hiper-realistas que imitam recém-nascidos. Essa espécie de massificação expõe traços significativos de uma cultura marcada pela regressão afetiva e pela negação das responsabilidades adultas. Embora tais objetos sejam, em certos contextos, utilizados com finalidades terapêuticas legítimas, seu consumo massivo revela elementos preocupantes de uma infantilização tóxica dos adultos, que deve ser analisada à luz da psicologia social crítica e das contradições do capitalismo contemporâneo.

Trata-se de uma mercadoria que mobiliza afetos, ansiedades e carências em larga escala. Vendidos com trajes personalizados, “certidões de nascimento” e kits de cuidado, os reborns não são apenas brinquedos sofisticados ou peças de coleção: tornam-se simulacros de filhos, com os quais muitas pessoas estabelecem vínculos emocionais profundos. Há casos em que adultos os tratam como se fossem bebês reais, atribuindo-lhes nomes, rotinas e até perfis em redes sociais. A realidade é substituída por uma encenação permanente.

Esse fenômeno pode ser compreendido como parte de um processo de desresponsabilização da subjetividade contemporânea, no qual a maturidade emocional é substituída por relações simbólicas substitutivas, livres de riscos e compromissos. A vida adulta — marcada por trabalho, cuidado, decisão e transformação do mundo — é deslocada para o consumo emocional passivo. Numa sociedade do espetáculo e da hipermercantilização da vida, cuidar de um boneco pode ser mais “confortável” do que enfrentar a dureza dos vínculos humanos reais. Trata-se de uma alienação afetiva travestida de afeto.

Ao invés de estimular o amadurecimento subjetivo, a cultura do reborn — em seu aspecto mais regressivo — reforça uma lógica narcísica, de isolamento e autoengano. É expressão de uma subjetividade fragmentada, que recua diante dos desafios da vida coletiva e da construção de vínculos transformadores. O capitalismo tardio, em sua fase de hiperconsumo e precarização das relações sociais, não apenas destrói laços comunitários, mas oferece “soluções” emocionais que anestesiam o mal-estar sem combatê-lo.

Do ponto de vista político e ético, isso levanta sérias questões. A naturalização dessa infantilização tóxica mina a capacidade crítica, dissolve vínculos comunitários e enfraquece a disposição de luta. Uma subjetividade aprisionada em simulacros afetivos é menos propensa a se organizar, a enfrentar as mazelas sociais e a transformar o mundo. A infantilização, nesse caso, é funcional à dominação: desarma a consciência crítica e consolida o conformismo.

É preciso resgatar, contra essa lógica, uma ética do cuidado real, do vínculo vivo, da construção coletiva. A psicologia social, quando articulada a uma visão revolucionária da sociedade, tem a missão de denunciar os dispositivos de controle simbólico que reduzem a potência humana ao consumo passivo. A luta por uma sociedade emancipada passa também pela libertação subjetiva: pelo rompimento com os simulacros e pela reconquista da vida plena, concreta, comunitária.


*Carlos Lima é economista e dirigente da CTB e Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro

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